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O dilema entre ser mãe e profissional

O trabalho feminino existe desde que as sociedades tribais começaram a se organizar. Cabia aos homens caçar e às mulheres o plantio, a colheita e os cuidados com o lar. A divisão de tarefas era demarcada pelas características físicas e pela força. Com o desenvolvimento, a divisão de trabalho por gênero continuou a existir de acordo com o conhecimento adquirido: homens exerciam o ofício de ferreiros, militares ou operários, e mulheres se dedicavam à casa e à educação de crianças.

Esta situação permaneceu até o início da Segunda Guerra Mundial, quando os homens seguiram para o front. As mulheres permaneceram nas cidades e assumiram lugares até então ocupados exclusivamente por eles. Os desdobramentos são conhecidos: as relações familiares sofreram modificações em sua dinâmica na medida em que, pelo menos no que diz respeito a trabalho, a mulher passa a ocupar o lugar do homem.

De certa maneira, ela - que tinha apenas papel de mãe, esposa e dona-de-casa - passa a ter a possibilidade de agregar outros papéis sociais, como o de trabalhadora e provedora. Em um primeiro momento, isso ocorreu devido a uma necessidade social. No entanto, a situação abriu um precedente sem volta, e hoje a mulher continua ocupando postos de trabalho.

Constituiu-se, então, um cenário permeado por um dilema que se faz presente até hoje: se a mulher fica longe de casa, quem cria as crianças? Da mesma maneira que o ato de prover foi partilhado entre homem e mulher, seria natural que o mesmo ocorresse com a responsabilidade de criar os filhos.

No entanto, apesar de os homens assumirem cada vez mais um papel ativo na criação dos filhos, muitas mulheres ainda sentem que o peso da responsabilidade de criá-los recai somente sobre os ombros dela. Sendo assim, frente a alguma dificuldade apresentada pelos filhos, como ir mal na escola ou uso de drogas, as mães - principalmente as que têm carreira profissional - podem ser tomadas pelo sentimento de culpa. No discurso coletivo, a chamada "culpa materna" já foi exclamada em dois extremos.

Um deles a responsabiliza por todos os males: "a criança vai mal na escola porque a mãe não cuida do filho, só se preocupa consigo mesma". O outro extremo a isenta de qualquer responsabilidade: "as mulheres não devem se culpar - elas têm de ter vida própria. Não é culpa da mãe que a criança não tira boas notas ou apresenta comportamento inadequado; o problema é do sistema escolar que é repressivo e não permite que a criança se expresse livremente". Vale ressaltar que a culpa pode ser definida como o sentimento de ser responsável por algo ruim ou desagradável que ocorre com outra pessoa, pelo sofrimento do outro.

A culpa pode gerar consequências que consistem em compensações desequilibradas para favorecer a vítima do sofrimento. No caso das relações entre mães e filhos, sugere-se que nenhum dos dois exemplos seja considerado verdadeiro. É fato que a mulher desempenha inúmeros papéis, e ela não precisa se sentir culpada por todas as dificuldades dos filhos pelo fato de não desempenhar o papel materno com exclusividade.

No entanto, ser mãe implica se responsabilizar por condições suficientemente boas de higiene, educação, saúde e manejo de situações com as quais a criança é incapaz de lidar. Ressalte-se que não é necessário que este papel seja desempenhado com exclusividade pela mulher; no entanto, uma mãe não deveria se eximir da atribuição. Quando a culpa surgir em momentos confusos ou repletos de julgamentos internos e externos, a mãe deve ser capaz de inserir a palavra "responsabilidade" no contexto.

Naturalmente, seu papel está acoplado à responsabilidade, sim, mas ela não é a única responsável pelas dificuldades dos filhos. Desta maneira, acredita-se que o sentimento de culpa repetitivo, que prejudica o desenvolvimento de mulheres e crianças e muitas vezes é gerado pelo dilema trabalho x maternidade, pode ser transformado
em atitudes que promovam o desenvolvimento de mães e filhos.

*Mariana Chalfon é psicóloga