Humanizar o parto
Até há pouco tempo, ter um bebê era um evento familiar. A casa se enchia de parentes, parteira e vizinhas experientes que vinham ajudar nessa hora intensa, em que a mulher está vulnerável. Cada uma cuidava de um aspecto, a limpeza, a alimentação de todos, o cuidado com as outras crianças, mas sempre havia uma ou mais mulheres que ficavam junto ao leito do parto, conversando, dando sugestões, oferecendo uma toalha úmida sobre a fronte, enquanto a parteira fazia seu trabalho.
O tempo passou e as gestantes agora têm seus bebês em grandes maternidades, cercadas por equipes médicas e, se tiverem sorte, na companhia de seu marido. Porém, não há, nesse novo cenário, uma mulher experiente que a acompanhe desde as primeira contrações até a chegada de seu bebê, que possa lhe dizer que está tudo bem, que lhe dê a mão, que dê sugestões de posições e de atividades durante as horas do trabalho de parto e do próprio parto.
Não havia, porque está surgindo no Brasil uma nova profissão: a doula. São acompanhantes de parto profissionais, inspiradas no modelo americano, onde atuam há pelo menos duas décadas.
Alguns hospitais públicos com projetos de humanização do nascimento já têm em seus quadros as doulas voluntárias, recrutadas na população e treinadas para a função. Na Grande São Paulo, pelo menos três hospitais já aderiram ao programa e vários outros estão em fase de estudos para adequar instalações e pessoal voltados para essa nova realidade.
Na maioria das maternidades privadas é o médico quem autoriza a entrada dessa profissional nas salas de parto. Para ter uma doula durante seu parto, a grávida deve entrar em contato com a profissional depois do terceiro mês de gestação, de forma a descobrir quais as suas possibilidades durante o parto. A maioria das doulas também oferece um curso de preparação para o parto, com dicas de exercícios, dos primeiros cuidados com o bebê, amamentação, entre outros assuntos importantes.
Como funciona o parto humanizado
Quando a futura mamãe entra em trabalho de parto, liga para a sua doula e passa a ser acompanhada por ela desde sua residência até a maternidade. É lá que seu trabalho será fundamental. A doula oferece massagens, palavras de incentivo, dicas de respiração, formas de relaxamento e muito carinho. Ela também auxilia o pai do bebê, na medida em que explica tudo o que a mulher está passando, sugere massagens e posições para facilitar a chegada do bebê.
A doula só vai se separar da família quando o bebê já estiver sendo confortavelmente amamentado no colo de sua mãe. Trabalhando como doula há alguns anos na região de Campinas, Dorothe Kolkena explica que "o parto passou de um evento domiciliar, social e familiar para um evento médico -hospitalar. Mas as gestantes continuam tendo necessidade de um apoio afetivo, físico e emocional. Essa é a minha função quando acompanho um parto."
Para Ana Cristina Duarte, que atua há três anos na orientação e acompanhamento de gestantes, forma-se um elo profundo entre doula e parturiente, pois elas passam a gestação e o parto dividindo as emoções que aparecem com tanta intensidade nesse momento.
Indicadores positivos do parto humanizado
Pesquisas realizadas em vários países sinalizam que a presença de uma acompanhante de parto profissional é responsável pela queda das taxas de cesárea e de procedimentos médicos, como, por exemplo, o uso do soro, anestesia e fórceps. Há ainda outros indicadores bastante favoráveis, como menor tempo de internação, maior tempo de amamentação, menor solicitação de medicamentos, menores taxas de depressão pós-parto.
Mas não são só as gestantes que saem ganhando com essa parceria. Segundo o médico Marcos Tadeu Garcia, ginecologista e obstetra, diretor da Maternidade do Hospital Ipiranga e professor de obstetrícia da Faculdade de Ciências Médicas de Santos, a equipe médica também se beneficia com a presença da doula no parto, pois o ambiente fica mais sereno, a gestante se sente muito mais segura e o parto transcorre com maior tranquilidade.
Embora a acompanhante do parto não efetue qualquer procedimento médico, exames, diagnósticos ou sugestões terapêuticas, sua presença pode fazer uma grande diferença no sentido de humanizar o parto e proporcionar à mulher uma experiência positiva, que irá se refletir no resto de sua vida e de sua família.
Para o doutor Garcia "a atuação das doulas pode ajudar na diminuição de cesariana, na medida em que as gestantes sentem-se mais confiantes em dar à luz naturalmente e os médicos são menos solicitados durante todo o processo de trabalho de parto".
Embora a atuação da doula possa diminuir as taxas de cesárea, essa questão torna-se secundária diante da missão dessa profissional, que informa os prós e contras de cada procedimento, mas que aceita e defende as escolhas de suas clientes. Dar à mulher a possibilidade de saber com antecedência o que é melhor para ela é a prioridade das doulas.